segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

como já dizia cat power, "...it's damned if you don't and it's damned if you do!"

A cena é a seguinte: ele está deitado em sua cama olhando para o teto, sem piscar, coberto por um lençol branco com alguns desenhos verdes. Hesita a se levantar diversas vezes. Queria poder dizer o que pensa, o que se passa pela sua cabeça, mas não posso. Não sou ele, não sei ele.
Depois de confirmar a não-presença de alguém por perto, se levanta. A irmã? No quarto, lendo. O irmão? No computador, conversando. O pai? Ar fresco tomando. A mãe? Na cozinha, arrumando. Os cachorros? Na grama, correndo. O vento? Refrescando por aí, levantando saias e cabelos. E eu. Eu estou no gabinete, sentado na poltrona, esperando-o.
Leva alguns minutos para chegar ao seu destino, pois suas pernas fraquejam, seu abdômen dói e sua mente repensa. Mas já estava decidido. Caminhou mais depressa, mas com bastante cuidado para barulho não fazer.
E lá está. Pensa em acender a luz, mas sabe exatamente onde está o que procura. Abre a gaveta, a toca com a ponta dos dedos, respira fundo. Segura-a entre seus cinco dedos da mão direita ou esquerda. Nessas horas, tanto faz.
Começa a erguê-la para perto da cabeça. Me vê. Eu me levanto, obviamente. Gaguejo, hesito em falar duas vezes. Mas sai: “Posso te pedir apenas uma coisa?” Ele acena com a cabeça para que eu prossiga. “Um abraço. Só isso, mais nada.” Oferece-me a mão vazia, seguro-a; guia-me até seu corpo e dou o meu pedido por feito. Mesmo assim, permaneço entrelaçado em seu corpo.
Sem mais nem menos, o barulho da arma soa tão alto que seguro o mais forte que posso.
É nessa hora que as cortinas vermelhas de seu sangue baixam e a platéia alienadamente aplaude. Alguns segundos intermináveis de palmas misturadas ao som de meu choro soluçado, aos gritos da mãe e da irmã, aos “o que foi isso?” do irmão e do pai, aos latidos dos dois cachorros, aos passos apressados de todos eles e ao vento que pára, congelado.
E é só isso, mais nada.

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