– O conto que eu conto agora não se basta em si só: ele é além; transcende que nem borda transparente. Procure-me, procure-se nele e em tudo o que lhe entenda de mais do nada que lhe fizeram só por aqui e por dentro-fora de si mesmo, querido amigo. O que de muito belo toca, o dedo anota. E por mais leve que seja a canção, dê-lhe um toque levíssimo de açafrão, que a cor amarela é bela tanto ao nascer quanto ao pôr da estrela-maior que vemos daqui de cima-baixo.
– Diga-me simplesmente: o sol, estrela-maior que nada além é. Não se precisa de mais palavra para o que já reúne em si só o que já é por total.
– Pois que se engana, denominado A. Nenhuma vogal, por exemplo, pode lhe definir o que é. Se chamo-te A é apenas porque não sei eu o nome e o que tu és. Não te conheço, não te sei. Mas confirmo que, nome por nome, nada define o belo da natureza. Pois que diga o contrário, caro viajante.
– Pois que não digo, pois, além de ser fácil de persuadir, encantaste-me com tuas palavras e com a mais pura verdade. Não me entenda por mal, mas repito na boca o que me colocaram na cabeça desde criança. Nasci em família cética, desonrada das letras e, por isso mesmo, detestadora. Ora, pois veja só: tanto sou de minha família que nem sei se o que disse existe. Existe?
– Isso muito não importa, caro viajante do pé andante, pois, palavra por palavra, a gente inventa uma a cada momento para cada situação. Palavra não é para isso mesmo?
– Pois me diga, que eu nada sei. Como disse, nasci desonrado e desamigo das letras, que minha família não tinha nem papel em casa. Se tinha tinta, era para pintar parede e só. E receita de bolo era só pelo fio puxado da cabeça.
– Eu nada lhe afirmo, pois cada um descobre o que se quer descobrir e cada um obtém a sua própria verdade supra-interior. Não lhe interfiro no pensamento arrojado de palavras, que estas são tuas, e só tuas.
– Se por palavras não sei expressar, talvez um sorriso me sirva. Penso que assim retribuo-lhe, mesmo que pouco, a rápida amizade de trem. O que posso fazer por ti, querido amigo? – se é que assim posso te chamar.
– Não me faça nada além do que já fizeste: companhia. O bom homem sabe.
– Sabe o quê?
– O que tu queres saber e, por não olhar, quase inspira pelo nariz. Tenha calma e cuidado, que no próximo vagão, se não te alertares, inspirar-lhe-á a náusea do riso. Bom sorte com a vida.
– Obrigado. Desejo-lhe o mesmo.
– Não deseje. Tenha para si. Adeus.
– Adeus.
que coisa mais filme!
ResponderExcluiradorei, como sempre haha