Eu nunca deixo de fazer essas observações, mas elas são imprescindíveis: um carrossel em miniatura, um móbile com tons de roxo e amarelo, um óculos de aros finos e vermelhos e as cortinas sempre fechadas. Sempre, sempre fechadas. E os outros objetos, sempre muito empoeirados. Empoleirados lá no canto esquerdo, sempre esquerdo, da prateleira central.
As paredes deveriam mudar sempre de cor, como seus olhos. Mas são sempre brancas. Seria inocência demais justificá-lo pelo fato de o branco não limitar o ambiente. É mais por conta do amarelo. Pelo amarelo de seus vestidos, sim. Nem o macacão escapa. As velas, os chás, as xícaras... FOC: fissura obsessiva compulsiva. Os olhos de nipônica não me enganam. Sua gama de cores não passa do dégradé limitado.
“Assim, a beleza do verde acalma seus laços e o azul apalpa seus seios. O som ecoa pela taverna e ensurdece os vestígios de luz da manhã. O soutien escorrega pelos braços lânguidos e entupidos de loção hidratante e...”. Seus livros cheios de lascividade disfarçada. Não é muito difícil de acreditar que ela é uma daquelas que imprime páginas de pornografia que sofreu um certo tipo de eruditação e coloca entre as folhas da revista informativa.
Outro dia, roubaram-me o título de nuvem negra. Não imaginei qual seria a reação dela diante do noticiamento do fato. E não soube. Ela não me deu ouvidos naquele instante; estava ocupada despejando o café na xícara e, com o transbordamento do mesmo, na mesa. Quatorze minutos e ela percebeu. Largou tudo lá e foi ao telefone. Chamou o corpo de bombeiros, naturalmente. Sete dias depois e queimou um guardanapo “acidentalmente”. Chamou um escritor famoso que pouco importa o nome, mas sim o conteúdo.
Todo esse conteúdo é nada. Nada no cosmos, nada no espaço: panos vermelhos, pterodátilos flamejantes, raios na face, lantejoulas flutuantes, músicas de pagode e a animação do bairro que não me atinge. Faltou-me o pé. A luxúria e o pé. Oferecer, talvez.
E não forem sete dias depois e nem cinco anos: minha mente não trabalhou esse tanto até lá. Foi ontem, anteontem, tanto faz. Só sei que as pessoas voam. E roubam os títulos dos outros.
Nenhum comentário:
Postar um comentário