sábado, 12 de março de 2011

fundo.

eu comecei com um cachimbo, uma coisa da qual eu nunca precisei de verdade. mas, quando eu deveria seguir em frente, minha primeira escolha me fez repensar: por que haveria eu de me livrar dos meus penduricalhos, ou melhor, das minhas memórias concretas? se eu fosse continuar com aquilo, iria terminar jogando o sol e a lua fora também. e, convenhamos, sol e lua não coisas para serem jogadas numa lata de lixo - aliás, nem ali cabem. mas seria insanamente fácil dizer "desculpa, não é possível", principalmente porque impossível não é uma palavra aqui, mas meramente a ilusão de uma possibilidade utopicamente, e duplamente, inalcançável a olho nu. tudo que é difícil de enxergar quando a luz do sol, ou até mesmo da lua ilumina a cidade sem sombras, aquilo que faz daqui um lugar especial: disso que eu mais preciso me livrar, mas não... não dá.
por isso resolvi acender um palito da caixa de fósforos e tentar aquecer um dos meus dedos, qualquer um, antes da cobrança. talvez isso me iluminasse. ou queimasse, quem sabe. mas eu precisei de luz e não havia luz: as nuvens cobriram o sol e a lua durante toda a duração da minha faxina privada. gritar de pouco adiantaria: o sol e a lua não ouvem aqueles que blasfemam a sua impavidez. descer e voltar em busca de algo que não existe para atrair-lhes a atenção nem passou por minha cabeça, pois sombra se criava ali, naquele canto escuro do quarto. quando eu mais precisei da lua, ela estava escondida. quando eu mais precisei do sol, ele pareceu congelar. quando eu mais precisei de uma iluminura no início do meu rosto, soube que a tinta havia acabado. o que faria eu, então, junto à escuridão? escrever às cegas não parecia uma boa solução para quem sempre soube o que disse, analisou cada traço antes de escrevê-los. era o momento de arriscar, então? mas assim, tão repentinamente, deixando-me tão apreensivo, tão... despreparado, inexperiente, sem palavras que definissem corretamente? eu fiquei parado, e só, esperando alguma luz. mas nem um reflexo surgiu sobre os meus olhos.
eu tive de congelar a mim mesmo, esperando que o tempo evaporasse os meus vapores, os meus cheiros que não cheiravam e as minhas lágrimas secas e rachadas. minhas rachaduras, aquelas que já havia abrigado as mais belas flores na tenra idade, agora eram chão seco onde cacto guardava nenhum gota e nem mandacaru nascia. mandacaru aliás, foi a secura de idéias que me surgiu. uma flor que de nada adiantava à minha situação. secura, secura e escuridão: duas coisas que não combinavam na minha mente obscurecida pelo ato automático de abrir e fechar os olhos quando um raio de luz ilumina o olho que ainda funciona. o esquerdo que me restou e que me fazia ver através das venezianas da cozinha, o mesmo olho que agora não vê mais nada nesse eclipse bloqueante, se é que isso existiu realmente. o que me faltava era uma gota do branco, da junção das freqüências que eu consigo enxergar.
uma gota de leite que caiu no meu mar morto. será que eu deveria esperar mais do que aquilo? será que aconteceria? ou por que diabos eu fui começar a fazer um algo que eu nunca quis? por isso, comecei a nadar fundo em mim mesmo, à procura de quê mesmo? algo que nem sei. aprofundei-me em algo que não sei, em busca de algo que não sei se conheço e o qual não sei se deveria realmente tomar conhecimento. mas eu mergulhei fundo, bem mais fundo do que deveria, fui em busca de um sentido para aquilo, será? o que será que eu estou fazendo, aqui? acho que eu nunca havia me perguntado isso antes.

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