Uma brisa sopra leve entre os cachos de cabelo, dançando bem pouquinho, quietinho entre as orelhas mornas. Curva caminhos que ninguém imaginaria e o vapor surge do contato com a pele. Um suspiro que é solto no ar, um grama de sono pregado nos olhos delicados e enquanto a gente vê o mundo por aqui, ela vê tudo por de lá.
Era simplesmente isso que eu tentava dizer a ela, mas todo o álcool que eu havia bebido não me permitiria dizer isso de uma forma bonita e delicada. Eu agora via tudo turvo e nada me parecia real. Sim, esse era o meu papel: pensar coisas e nunca dizê-las. Por não saber; por não ter como.
Na verdade, eu nem sei porquê que eu fui beber. Eu nem queria; nem devia. Acho que foi da ocasião, de qualquer horizonte que fitei ou justamente porque te vi ali sentada. Ou por um quadro bonito.
Ela pensa que isso tudo é muito engraçado. Ri da minha cara uma risada alta de garganta retorcida e me olha com olhos de compaixão.
Engraçado é eu falar em álcool sem nunca ter posto uma gota de álcool no meu copo – no meu corpo. Eu deveria tirar férias, mas não. Eu não pensaria numa coisa dessas e justamente eu, eu trabalho, eu e o trabalho, eu e o vício do trabalho. Toco piano por isso mesmo. Não toco piano.
Serei eu poeta? Então, por mentir desembestadamente, deveria destrambelhar-me e destrancar do armário todas as desavenças e as minhas avencas? Podre de mim, Madame Bougalí. Invento nomes e veto personalidades não por mim, mas por ela, que ri bem perto de minha face, fazendo sair um ar de desespero do meu poro central do nariz. Meus músculos perdem a flexibilidade e não existem mais olhos em minha face. Tudo o que eu via foi de dentro para fora, pensando num futuro incômodo sentado naquele sofá verde tão recorrente e repetente da minha vida escolar. Não que eu tenha fugido do teste do sofá, mas existem coisas que não são conseguidas pelo sexo. Eu, por exemplo.
Cortaria em pedacinhos então o meu coração? Ai, ai de mim que nem sonho com amor. Penso só em cocô de passarinho e minhocas no jantar. A podridão me afetou seriamente, e especialmente o cerebelo. Ou pensas tu que minhas pernas são feitas de metal? Pobre de mim se dançasse uma valsa contigo. Pena que não sou homem-de-lata e não bebo uísque até morrer. Até queria, mas fumaça só se for sem cheiro. Ou de fogo, que é a única que faz parte do meu mundinho irreal e soliloquitário.
Flor, amor, faço rima ser ardor. Só queria um ventinho aqui que tá fazendo um calor danado. Enquanto Seu Vento não vem, acho que fui ali passear nas ecsórias. Dá licença que vou me olhar no espelho e ver se encontro em mim alguma roseira que não tenha sido afetada por doença incurável. Ai, Pedro. Pára-te já com essas coisinhas na mão que eu já não janto mais com flor de lampião (luz, luz)!
E que se faça luz nos meus olhos, meu deus do céu!
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