três pedras caíram sobre tua cabeça desnuda. dor que não se mede, ódio natural que não se compara: ali havia muito pouco do que se fez. ainda era pouco, três pedras. o desastre merecia ser maior; mereceria se não fosse pela compaixão que senti. às vezes eu sinto ódio de mim mesmo por ter pouco ódio dos outros. é muito pouco o meu rancor quando chega a hora de retribuir. falha minha ou incoerência, sou compassivo quase por completo. deveria voar de tão leve que minha mão é quando carrego pedras. mas os olhos, estes sentem e ardem e eu não consigo fechá-los. queimando a retina, a luz entrando desfocada e desnuda, vejo todas as suas nuances e sinto que vejo na minha frente um borrão de cor que não merece ser machucado. que mal uma borboleta haveria de fazer? correu atrás da doçura, não merece a acidez da minha pele. minhas ações tornam-se ternas. ai, como eu não queria esmorecer diante do meu ódio! é essa fraqueza em mim, faz-me transmutar-te, tornar-te extenuado e macio, tornar-me prostrado diante de ti, dos teus olhos semi-abertos. e a lágrima que de ti escorre, que deveria ser um rio, um oceano inteiro, é lágrima falsa, dissimulada Capitu, que só me faz procurar sinônimos em mim mesmo para tentar vencer a barreira da piedade.
queria que o sol lhe queimasse a pele e que a lua te derretesse, mas desejo-lhe tudo à distância, quando não te vejo ou quando não te posso sentir. que asco. enojo de mim mesmo diante dessa piedade pedante, que não deveria ser. não, eu não tenho orgulho da minha compaixão. dane-se a minha compaixão, eu quero que os lobos corram e comam os teus ossos. é muita tensão para acumular em membranas, muita energia acumulada em minha garganta e meu estômago, pobre coitado, faz-me sentir o líquido resultante da auto-compaixão. deixar de comer sua carne para não te devorar, porque não te como, porque não te gosto, não gosto do gosto da tua e de nenhuma carne. mas eu posso te esquartejar, posso ser cruel. eu posso? eu deveria. quero; mas não posso. ai, como eu queria te ver cair da escada, ouvir o som dos teus ossos a se partir, uma massa ínfima a lhe atravessar e estraçalhar-te os pensamentos. teus olhos olhos traiçoeiros a derreter em dor, pedindo compaixão, a doçura que sempre te dei e não, eu imóvel a nem sequer piscar diante de tal quadro outrora impossível. impassível diante de ti, eu a pisar-te metaforicamente, sentir tua dor a esguichar sangue em meus olhos. eu. diante de tudo. a não sentir. nada.
eu te odeio. e ao mesmo tempo, sinto pena de ti. e não ouse dizer que isso é amor. porque isso não é amor. não é amor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário