terça-feira, 29 de maio de 2012

tríptico da decisão: o não.

eu nunca pensei, nem por um momento, que ia escrever algo assim para você.
tento disfarçar um pouco, enrolar com mais das minhas palavras que você, ao que parece, odeia; enrolar com mais "desculpa, mas eu...", enrolar com mais e mais palavras pra poder te dizer uma coisa que eu, acho, já disse e tentei desdizer porque, ao que parecia, você tinha deixado isso para trás, mas, ao que me parece agora, não.
não, você não me desculpa. não, eu não estou escrevendo num parágrafo só. não, eu não estou tentando causar efeito de fala. não, eu realmente não te entendo. não mais. não sei o que aconteceu com você, não sei porque sente asco quando eu discordo de você - e não de ti -, porque não sente quando outro alguém diz exatamente o mesmo que eu, porque é tão agressiva comigo, porque parece me odiar quando abro a boca ou encosta o dedo no teclado. o que se passa com você? o que se passa comigo? eu realmente gostaria de entender, mas, ao que parece, se eu o tentar, vou escutar palavras carinhosas como "queridinho" e, mais uma vez, como já ocorreu antes, receber um tapa metafórico na cara. se eu não levanto o nariz para falar, se eu procuro ser o mais delicado para não atacar ninguém, se eu falo de um jeito que nunca causou problema e, do nada, é o principal problema de um, er, relacionamento... sinceramente... eu não entendo. e eu poderia entender. se eu corresse atrás.
ponderar, ponderei. vi filmes para espairecer, coloquei poltrona no quarto e tudo. li em espanhol, não toquei no livro que você me emprestou... mas nem assim. nem assim. toda frase legendada, todo o inglês escutado dos filmes da década de 60, as palavras que eu não quis buscar no dicionário em espanhol, tudo só me dizia uma coisa. e essa coisa que eu não preciso dizer, que eu sei que importa mais, mas que... que eu não sei se devo dar tanto esse valor, porque, enfim, eu não ponho minha mão no fogo por você. e não, não é para você se sentir especial. justamente porque eu não coloco por ninguém. justamente, por que você se acha, assim, tão especial, tão diferente de todo o mundo, que deve ser notada e reverenciada da cabeça aos pés? a todo instante? por todos? por aqueles que você diz serem frios? sei que sim, mas temo que não, mas você já parou para pensar que, mesmo o sol não é o centro de tudo? cada planeta, casa cometa, cada poeira e cada pedaço do vácuo tem a sua vida (ou não-vida) para cuidar. da loira mais gelada ao moreno mais antissocial. até aquele que tem barba com pêlos pretos, brancos e ruivos.
é, eu me dividi entre esses dias entre o lutar e o não lutar, entre o pedir desculpas pelo que não sei que ou se fiz, atender apenas a um capricho seu, ficar de boca calada sempre que você estiver por perto, responder "o.k." sempre que você fizer um comentário, acatar todas as suas decisões, enfim, me submeter a escrever a preposição depois de vírgula. por você, para você. mas, e sempre o mas, você sabe de uma? você, sim, você sabe de uma. de várias, aliás. e vários também. várias coisas e vários trechos da música que se aplicam à vida real. e não é mulher da vida nem mulher da minha vida. nem poesia, porque quando eu disser que eu estou em alto-mar, é porque eu estou realmente em alto-mar. se eu disser que passei a tarde lavando lama, não é metáfora, mas pura literalidade bentônica de aula de campo, de palavras que parecem ser difíceis, mas que são linguagem científica que, enfim, eu não vou abdicar. eu não vou.
que fique claro, porque já está preto no branco, ao menos no rascunho, e que fique também branco no preto, café coado, papel passado, amor mal-amado. pode me chamar disso também. pode ignorar quando eu tento dar um último passo porque eu não ligo para perdão de ninguém. pode continuar achando que você é o centro, é a matéria do universo, e que eu tenho o nariz em pé, que tenho o pé grande, os braços incapazes de abraçar o mundo, de abraçar você, de ser sociável, de ganhar amigos, de ser feliz, de ser feliz de ser feliz de ser feliz de ser quem eu sou, de ser quem você quer que eu seja. porque eu digo, em letras garrafais: eu sou incapaz de ser quem você quer que eu seja. já te disse que eu não sou meu nome, mas ele se escreve com l minúsculo. e você sabe. mas você não se importa, você não quer ver como eu vejo, só o seu olhar que importa. e quando eu digo que eu também tenho o direito de olhar só pelo meu ponto de vista, você ri de mim, esfrega na minha cara que eu estou errado, que "...dessa forma, você vai perder seus amigos."
e não, nada está tranqüilo. e não, eu não falo da metafísica do caos que tá aí fora, da que está ocorrendo nessa cidade quente ou dentro de mim. eu falo desse microcosmo, desse espaço entre a gente que não está ficando nem branco nem preto. ele tá ficando é transparente. ele tá ficando é inexistente. e eu, eu sinto que vou deixar porque, assim como você, eu tenho o direito de não te perdoar. porque, quem você pensa que é para dizer, de cima da caixa de madeira vazia, que você não sabe se vai me perdoar? quem eu penso que sou escutando tudo isso e aceitando o fato? quem sou eu me colocando em dúvida se te derrubo do caixote e te ofereço a mão e a cara à tapa ou simplesmente viro as costas?
sim, agora me dá uma vontade que não cabe nos dedos de te dar as costas, meu sobrenome em plural, porque quem não suporta mais sou eu, quem sente asco agora sou eu. eu cansei de buscar delicadeza e receber escárnio e gozação, de receber uma resposta dizendo que é o que eu disse que não é ou que não é o que eu disse que é. cansei desses espaços, desses copos de vidro que ressoam e não se quebram de vez. me dá agora uma vontade imensa de pegar o louça chinesa que eu planejava te dar no seu aniversário e quebrar em cacos na sua frente, sem te dizer uma palavra, sem te deixar saber o que elas significam para mim, o que elas significam para você. porque eu não sei também se eu me rendo mais uma vez e fico com o olho irritado em público, pedindo desculpas com esses olhos tolos, arriscando dizer que queria ter um bolo de folhas azuis de volta, uma máquina do tempo e voltar pra quando tudo era mais fácil. é fácil dizer e querer tudo isso, mas eu sou daqueles que não são amigos do tempo e que constroem a máquina e se conformam em expôr as vísceras e o coração em público. não, eu não vou dar nenhum pulo para escapar. não, eu não quero dizer a última palavra. eu digo "o.k.", eu digo o meu "pode dizer", eu nem digo mais nada, porque você pode dizer, porque eu disse que desisto, agora, sem nem você ouvir, porque não, eu já me decidi, por agora mesmo, e sou teimoso para voltar atrás. não, eu não volto atrás, e digo para mim mesmo que eu desisto. digo que sou covarde por nem tentar, por achar que uma perguntar para esclarecer permissão de presença não respondida é respostas e motivo para minha ação, ou minha não ação, mas é isso. você diz que não sabe e eu assino o documento, mesmo sem você saber, que eu desisto disso aqui. porque eu disse uma vez, mesmo que ninguém esperasse que fosse eu, eu disse, eu disse que, mesmo que eu não tenha escrito, eu disse, mesmo sem ninguém perguntar quem tinha morrido para mim, mesmo ninguém percebendo o meu riso falso e a minha lágrima de riso ser de dor, eu disse uma vez e digo de novo, e eu digo de novo para não ficar diferente, eu digo simplesmente, mesmo que ninguém se lembre, e, antes que eu termine, eu escrevo como metáfora do que eu disse e direi de novo, e deixo um papel em branco com letra em tinta preta no centro do palco preto, deixo a platéia muda, sigo para a luz como completa ironia para onde eu vou, porque eu não vejo luz para onde eu vou, e eu também nunca vi luz aqui, eu, há muito tempo que não vejo essa luz entre a gente, essa bola de cristal, que virou bolha e pocou sem fazer barulho, sem produzir onda, sem produzir dor nem som, sem deixar resquícios de sua existência, porque a gente não vai sentir que eu deixei escrito no bilhete que eu não consigo terminar isso daqui.

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