terça-feira, 14 de agosto de 2012

eu estava na esquina, comendo um chocolate mentolado atrás do outro e olhando os pés apressados que passavam com medo das poças de água. eu vi a chuva vindo de novo, senti as gotas primeiro acariciando meus ombros desnudos, depois perfurando-os. eu me sentia sozinho, mas não queria que ninguém cobrisse meus ombros. o pior de tudo é que aquelas gotas, pontiagudas, traziam-me uma sensação que eu não conseguia produzir em mim mesmo. o sabor mentolado do chocolate derretia em minha boca, mas eu não consegui me incomodar com o sabor de pasta de dente. eu só sentia o sal das gotas, como as frestas de sol tentando transpassar as nuvens cinzas. o sabor indizível da insônia e a cor berrante que aparece ante a mim toda vez que eu fecho os olhos para ver se consigo dormir. em cada gota de água, um sabor diferente que causa uma confusão dentro da minha boca, que arranha minha garganta e que chega aos meus pulmões, torcendo os descaminhos de meu respirar. porque toda vez que eu engasgo, eu tusso e soluço. e quando eu questiono não mais a mim o porquê de tudo isso, recebo aquele olhar que é destino àqueles que a aqui não pertencem. e eu resigno, abaixo a cabeça, encosto os lábios, porque eu sei que daqui não sou. porque, como uma flauta doce que eu tive quando mais novo, eu sempre senti que o bege não era a cor para mim, o som doce muito menos. como se, ao assoprar, fios de ouro saíssem daqueles buraquinhos sem que eu realmente os visse; como se eu nunca tivesse dito em voz alta aquelas palavras naquela tarde de sol ofuscante, como se eu, ao perceber o erro, tivesse engolido tudo aquilo que eu havia conseguido dessarranhar. porque eu nunca quis mais do que ninguém quis e, mesmo assim, eu me sentia sozinho sentado naquele banco debaixo de um guarda-chuva preto que engolia eu e mais duas pessoas que ali não estavam. aquele espaço maior do que duas pessoas entre eu e o resto do mundo representados pelo diâmetro de uma guarda-chuva. o gato preto. a cauda. a casa. a árvore de natal, as luzes vermelhas e a falta de energia de todo natal. às vezes, me dava vontade de abrir um buraco no chão e cavar até chegar ao meio, ser engolido pela lava que nos consome por dentro, como se eu levasse ao pé da letra o conselho de entrar em contato com o que me compõe. enquanto eu chorava sem que ninguém percebesse, eu percebi que poderia ser muito mais forte, a ponto de cortar o cabelo a cada três meses. percebi que, se não, eu mesmo poderia pegar a tesoura e dar fim à minha própria inocência. que eu mesmo poderia vestir o casaco pela cabeça, sem precisa de um cabide que me guardasse depois de tudo pronto. eu percebi, como eu já suspeitava, que tudo dependia de com que olhos eu enxergava a vista adiante, borrada pela água ou ofuscada pelos raios de sol.

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